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domingo, 27 de junho de 2010

Texto: GUEVARISMO E OS CAMINHOS DA REVOLUÇÃO

Texto - GUEVARISMO E OS CAMINHOS DA REVOLUÇÃO

Luiz Bernardo Pericás

Neste artigo, Pericás pretende analisar o ideário político e as estratégias revolucionárias de Guevara. Para tanto, expõe as características do pensamento guevarista quanto a: guerrilha, internacionalismo, luta no Terceiro Mundo, o homem novo, a moral revolucionária, o partido revolucionário, o individualismo e sua idéia de marxismo dinâmico. Logo de início, o autor nos lembra que Guevara era uma figura contraditória, e que seus textos apresentam temas bastante abrangentes.

A opção de Guevara pelo foco guerrilheiro, é vista pelos críticos como anti-leninista e voluntarista. Entretanto, se a entendermos como um elemento de aceleração do processo revolucionário dormente, estas criticas se tornarão infundadas. A guerrilha é um partido de vanguarda (substitui os PCs – pois são tímidos) que atua para pressionar a derrocada do regime atacado e, junto com os camponeses e revolucionários, fazer a revolução. Essencialmente rural – mantendo contato, trocando informações, protegendo os camponeses, incorporando-os às suas fileiras e fazendo a reforma agrária no campo. Para Che, as massas populares são protagonistas das grandes mudanças, entretanto, considera que o camponês, por falta de cultura, necessita de direção revolucionária e política da classe operária e dos intelectuais revolucionários. Para ele, a guerra revolucionária é longa, somente após anos de lutas e de preparação das condições para a destruição do antigo regime, com a conscientização da população contra o governo e a favor da guerrilha, é que a revolução triunfaria. O autor nos lembra ainda que Che não desmerece o papel do partido na revolução, entendendo-o como fator de extrema importância na construção de um partido marxista-leninista bem estruturado. Lembra-nos ainda da crença em uma frente única contra o maior inimigo O imperialismo e seus colaboradores internos; assim, não descartava alianças com partidos de diferentes tendências ideológicas, pois estas seriam superadas no combate, e os objetivos comuns sobrepujariam os problemas e divergências e criariam coesão e maior união entre os combatentes. Feita, inevitavelmente, através de armas, a revolução deveria ser levado a cabo contra os latifundiários e a burguesia; deveria também expandir-se para outros países, para não terminar isolada e destruída pelos inimigos externos e pela falta de recursos.

Quanto ao internacionalismo, ressaltam-se dois pontos relevantes: um no plano de política externa de países socialistas e o outro se refere à conduta dos revolucionários/guerrilha. As nações socialistas devem dar e contar com o apoio político, econômico e militar entre si. O revolucionário deve estar pronto para lutar pelos mesmos ideais marxistas e humanistas em qualquer parte do mundo. Tais idéias transformaram Guevara no símbolo do combate desprendido de interesses especificamente nacionais e deram origem comparações com Trotski – ambos eram internacionalistas, anti-burocratistas e libertários. Também foram considerados a “consciência da revolução”, pois agiam de forma critica e decisiva, não aceitando todos os direcionamentos implementados nas revoluções, sendo por isso mal vistos por vários setores internos. Diferentemente de Trotski, Che não confiava plenamente nos sindicatos e desconfiava de sua eficácia na luta revolucionária, colocando mais ênfase no papel da guerrilha e do campesinato do que propriamente nas lutas proletárias nas cidades, porém sem descartá-las. Che não aceitava ser chamado de trotskista; nunca afirmou se concordava com a teoria da revolução permanente; dizia que havia vários Lênin e que os trotskista não contribuíram em nada para o movimento revolucionário. Para Pericás, nada indica que houvesse mais de um Guevara, também não o considera um trotskista nem um maoísta – embora concordasse com vários pontos defendidos pelos chineses. Guevara tinha como objetivo a luta em grande escala no Terceiro Mundo, com a guerra no Vietnã, a América Latina deveria ser a próxima frente contra o imperialismo. Seus projetos continentais e sua prática revelaram um ideal bolivarista.

Preocupado em forjar o espírito do homem comunista, Che defendeu e incentivou valores e estímulos capazes de criar o cidadão do futuro. Colocando como fator primordial o uso de incentivos morais no trabalho, o que representava um esforço em desenvolver a consciência socialista acima dos ganhos na produção. Para se chegar ao comunismo é necessário criar bases materiais ao mesmo tempo em que se cria o homem novo. O homem comunista deverá ter o espírito de sacrifício; deverá estudar e se aprimorar para se tornar completo; deverá ser um internacionalista, e estar pronto a lutar em qualquer lugar do mundo; deverá tentar ser sempre o primeiro em tudo; e deverá sentir-se parte de algo que vai além de sua individualidade, ou seja, parte integrante e atuante da sociedade, em toda sua plenitude.

Outro aspecto discutido foi a moral revolucionária. A disciplina era fundamental. Entretanto, não podia confundir-se com a rigidez estalinista, ou mesmo chinesa, tampouco com a extrema flexibilidade de alguns países da Europa Oriental, seria necessário encontrar o ‘ponto exato’. A partir da moral revolucionária, e todas suas implicações seria criado o partido unido da revolução, anti-sectário, anti-burocrático e estritamente ligado às massas, onde se aplicaria a disciplina de acordo com o centralismo burocrático, aberto à criticas e auto-críticas, e onde seus quadros fossem exemplo de consciência revolucionária. Quanto as tarefas impostos ao partido revolucionário, estão em concordância com as concepções de Lenin: (1) convencer maioria do povo do acertado do seu programa e sua tática, (2) conquistar o poder político e aplastar a resistência dos exploradores, (3) organizar o trabalho de governar a Rússia. Para Che, o socialismo não é uma sociedade beneficente, nem um regime utópico, mas um processo histórico-econômico concreto.

No tocante ao individualismo, não se trata de anular o indivíduo, mas a ação individual. Uma dupla existência: ser humano singular e membro da comunidade, como construtor consciente da história, junto com outros que lutam pela mesma causa. Para Guevara, o individualismo deveria ser o completo aproveitamento de todo individuo em beneficio absoluto da coletividade. Dentro do socialismo, o homem – através da educação e da compreensão de seu papel na comunidade, além da consciência revolucionária – teria a possibilidade de afastar-se da alienação, e com isso, ter maior liberdade e exercer sua individualidade de forma completa na sociedade.

O autor afirma que o marxismo ágil, dinâmico e heterodoxo de Guevara era traduzido na América Latina de sua época pela prática revolucionária de fato. A teoria de Marx apresenta postulados gerais que se aplicam de maneiras diferentes em cada lugar. Guevara representou uma elaboração nova do marxismo no continente. Como Lenin, dedicava-se a revolução, dava o exemplo, desenvolvia meios de difundir a propaganda revolucionária e tentava explicar às camadas populares de forma concisa seus objetivos. Como Trotski, tinha grande capacidade organizativa, e trabalhou para consolidar milícias populares e as linhas doutrinárias do exército. Como Mao, desenvolveu através da experiência, teorias na esfera da guerra popular e da guerrilha. Como Mariátegui, analisou a situação econômico-social do continente, e elaborou escritos originais sobre questões econômicas, sociais e políticas a partir da realidade que conhecia e dos clássicos marxistas.

Quais foram as implicações e conseqüências as linha guevarista na América Latina?
Para José Aricó, Guevara tornou-se um símbolo de Luta, foi incorporado ao imaginário do continente, e sua figura tornou-se quase santificada. Segundo Péricas, no lado prático, o guevarismo caracterizou alguns elementos inovadores: a incorporação do marxismo-leninismo às tradições de lutas sociais, rebeliões camponesas e militarismo da região, e a necessidade em se criar, no continente, uma filosofia política pragmática e ao mesmo tempo imbuída de aspectos elevados de ética e moral. Péricas coloca uma última questão: a consciência revolucionária precede ou sucede a luta revolucionária? Para Fidel e Paul Sweezy, a revolução propicia a consciência revolucionária. Guevara mencionara que a guerra revolucionária só deve ser iniciada em condições específicas, e como último recurso.

(Lucimar Simon)

domingo, 20 de junho de 2010

Texto: A POLÍTICA ARMADA: FUNDAMENTOS DA GUERRA REVOLUCIONÁRIA

A POLÍTICA ARMADA: FUNDAMENTOS DA GUERRA REVOLUCIONÁRIA.
PIERRE, H. L. S.

REVOLUÇÃO E INSURREIÇÃO

O autor inicia o texto falando que “nem todo movimento insurrecional é revolucionário”. A insurreição é o momento mais culminante da guerra revolucionária. “É o momento em que a massa revolucionária do povo, [...] armada e revoltada, toma a rua e o Estado, engolindo [...] as antigas estruturas e aparelhos de dominação, para deixar o campo limpo e adubado para novas formas de organização social”. (Ele vai discutir como “a insurreição foi se constituindo em um sofisticadíssimo instrumento da revolução”.) Historicamente a insurreição era resultado da reação espontânea da indignação das massas despertada pelo Estado. “Era uma explosão social sem nenhuma direção, apenas uma reação”. O que provoca a insurreição pode ser variado e circunstancial.

A liderança da insurreição “é alcançada e legitimada pela capacidade de mando demonstrada nos campos religiosos, militar, político, etc”. As insurreições espontâneas e inconscientes das massas levaram a classe dominante a perceber a “perigosa potencialidade de combate da massa enfurecida e insubordinada”. O que levou ao aperfeiçoamento do aparato repressivo dos dominantes para garantir sua posição de domínio e, concomitantemente, o povo aprendeu que “sua ação dependia da organização e preparação da violência desencadeada”. A insurreição já não podia ser espontânea, já que “as forças armadas governamentais foram materialmente muito bem equipadas pela classe dominante, e tática e moralmente treinadas para enfrentar e atirar no povo mal armada e pior adestrado”.

No século XIX a burguesia que havia assumido o poder pela sua prática revolucionária já não seria surpreendida pela suas próprias armas e nem cometeria os mesmos erros que permitiram sua ascensão ao poder. Agora ela passou a contar com um exército bem armado e disciplinado que reprimia as manifestações de rua. O sistema de contra-revolução que a burguesia desenvolvera era extremamente eficaz contra as insurreições desorganizadas das massas populares.

Daí a importância que Engels e Marx deram às questões militares: “para enfrentar a burguesia com alguma possibilidade de êxito, os revolucionários deviam estudar e aprender a arte da guerra desenvolvida por ela”. Devem estar atentos “à natureza das partes envolvidas no confronto, seu grau de organização, sua capacidade combativa, seus vínculos políticos, etc., e às circunstâncias próprias da ação”. Segundo Engels as massas insurgentes (povo) devem fustigar permanentemente as tropas reacionárias (do governo) e mantê-las na defensiva. Porque conter o avanço insurrecional é entregar a iniciativa ao inimigo, permitindo que ele reorganize suas tropas, concentre suas forças e despeje seu poder de fogo sobre as massas. O quartel da insurreição é a rua e sua estrutura dificulta manobras defensivas eficazes.

“O movimento insurrecional deve avançar por pequenas vitórias quotidianas, pois delas depende o espírito combativo das massas. A satisfação dos êxitos permanentes, por pequenos que possam ser, assegura a coesão popular e proporciona o ânimo necessário para continuar na luta”. Além de produzirem “efeitos devastadores nas tropas repressoras que começam a duvidar da vitória fácil sobre o povo mal armado, a vacilar sobre seu compromisso com uma causa que não sentem como própria, para finalmente se juntar aos esforços populares da insurreição armada”. O levante insurrecional deve ser largamente planejado para evitar o choque militarmente desigual com as forças reacionárias.

Para Lênin “as revoltas são a mais clara manifestação do descontentamento popular, que dão lugar à luta de greves organizadas e às manifestações políticas; temperadas ao calor da repressão, estas vão sendo reforçadas ou substituídas pela resistência armada. [...] Mas um passo decisivo para a vitória da insurreição é dado quando parte do exército regular se desprende e passa para o lado da revolução”. São as partes desse exército que formarão o embrião do exército revolucionário. Para Lênin o moderno exército burguês era a manifestação mais acabada da força, portanto a criação de um exército revolucionário indicava a apropriação, por parte do povo, da ciência guerreira da burguesia. Em seguida o autor passa a falar dos elementos constitutivos da insurreição: são os princípios estratégicos da insurreição a) ofensiva; b) oportunidade; c) unidade de comando; d) surpresa.

Ofensiva: O autor fala de dois sentidos diferentes que o conceito insurreição pode ter. Insurreição como fenômeno político que se caracteriza pelo longo processo de organização, dinamização e movimentação das massas; que pode estar composto de várias frentes, a política, a militar, a estudantil, a sindical, as milícias, as guerrilhas, etc.; e cujo objetivo final é a tomada de poder. Logo, nesse sentido político, a insurreição consiste uma totalidade estratégica que vai “desde a conspiração até o assalto final, a batalha decisiva”. Outra concepção de insurreição é a que a enxerga do ponto de vista estratégico caracterizado apenas pelo momento culminante do assalto final, do exercício político da tomada do poder, da revolta, da sublevação, a parte mais visível e virulenta da insurreição.

Tática e estratégia ofensiva ou defensiva: O autor discute a postura da insurreição quanto a uma postura ofensiva ou defensiva. A insurreição do ponto de vista estratégico deve ser defensivo (porque o poder de fogo do exército da classe dominante são mais fortes) e como momento tático, ofensivo. No desenrolar dos acontecimentos insurrecionais deve assumir alternadamente táticas ofensivas e defensivas a fim de preservar as próprias forças e atacar as forças inimigas. A guerra insurrecional deve ser no nível político, ofensivo (porque visa tomar o poder e por isso deve assumir iniciativa política); no nível estratégico deve ser defensivo (porque suas forças em relação ao exército da classe dominante são inferiores; deve resguardar suas forças para ganhar tempo para se fortalecerem); e no nível tático deve ser ofensivo (evitando posições defensivas fixas, já que essas seriam alvo fácil para maior poder de fogo do inimigo).

“Embora a estratégia geral da insurreição só possa ser uma estratégia defensiva – dada a desproporção desfavorável de força, [...] –, ela só admite o emprego de táticas defensivas móveis ou táticas ofensivas de intensidade de violência crescente até a vitória”. O emprego de táticas ofensivas não caracteriza, por sua vez, uma estratégia ofensiva. O movimento insurrecional só pode assumir uma estratégia ofensiva com a formação de um exército regular. Os confrontos devem ser planejados e avaliados para evitar derrotas: deve-se dar combate com a certeza da vitória. Assim a guerra revolucionária é uma guerra de movimento em que se revezam passos defensivos e ofensivos. A principal característica das insurreições vitoriosas é a sua mobilidade.

Oportunidade: “A oportunidade é a compreensão histórica do momento vivido. É a sensibilidade do ator histórico para perceber a correta maturação dos acontecimentos para colher os frutos esperados. [...] Aproveitar a oportunidade é agir na situação em que nossas forças se encontrem na máxima potência e as do inimigo minimizadas, que nossa possibilidade de êxito seja quase absoluta e a de fracasso, nula. Unidade de comando: “A fisionomia heterogênea dos movimentos de massa faz com que o êxito da insurreição dependa da coordenação das operações dos diferentes agrupamentos que fazem parte dela. [...] A centralização decisória é crucial para garantir o êxito de operações combinadas que requeiram a participação de diferentes frentes. Não há possibilidade de consolidar um triunfo militar sem comando unificado”.

Surpresa: resulta de duas características, o sigilo e a rapidez. É difícil lograr a surpresa no nível político porque as posições são claramente manifestas e atingem o nível da violência física quando os recursos pacíficos foram esgotados. No entanto, no nível das operações táticas a surpresa mostra toda sua eficácia. “A insurreição deve surpreender as forças reacionárias, mas não o povo”. Este deve ser objeto de um trabalho político prévio de esclarecimento e preparação. “A insurreição é apenas a manifestação explosiva de um longo processo preparatório na adversidade necessária da clandestinidade”. O autor fala ainda do dispositivo insurrecional definido por: a) estrutura; b)sistemas; c) comunicação e propaganda; d) inteligência; e) comando. Este “dispositivo insurrecional é a estrutura organizativa e operacional da insurreição”. São todas as forças socialmente operantes unidas intervindo positivamente no projeto insurrecional.

Estrutura: fala da quantidade de frentes que podem atuar numa insurreição pode ser grande e variada. “A correta coordenação das frentes é o que dá ao dispositivo [a insurreição] flexibilidade e mobilidade”. A organização das mais diversas frentes da insurreição “pode estar presente de maneiras diferentes em muitos lugares simultaneamente”. A versatilidade das frentes e sua articulação “pode, sincronizando operações isoladas, distrair o aparato repressor, como pode, realizando-as todas simultaneamente com ampla distribuição territorial, dividi-lo e isolá-lo, mas também pode concentrar todas suas forças em um único golpe para causar grandes estragos ou uma derrota decisiva”. “A flexibilidade do dispositivo consiste em poder golpear no momento adequado, com instrumento preciso, no local e com a força necessária”. Sistemas: fala da necessidade de se ter unidade da ação pela comunicação, inteligência e capacidade de mando quando se vai realizar o objetivo político claramente determinado. “A unidade da ação significa direcionar e concentrar o esforço de todas as frentes do dispositivo para satisfazer o fim estratégico”. Para que a insurreição seja eficaz deve ser caracterizada “pela univocidade decisória e a unidade de comando”.

Comunicação e propaganda: o autor fala que as massas são facilmente influenciáveis pela propaganda e por isso mesmo deve ser reforçado o caráter de sua conscientização na clareza dos objetivos e dificuldades de um confronto prolongado. Ele defende que “a comunicação é o sistema linfático do dispositivo”, ou seja, da insurreição. Porque “leva as informações e ordens do centro à periferia e vice-versa”. Ela deve ser amplamente difundida (para todas as frentes do movimento) e centralizada (tendo alto grau de coerência e unidade política). As ordens, mudanças de táticas, acontecimentos devem ser “rapidamente divulgados, de forma periódica, para todas as frentes” – por isso a importância da centralização. A comunicação deve ter uma linguagem o mais coloquial possível se se direcionar a um público geral da insurreição, mas também uma linguagem mais técnica específica para cada frente à qual se destina.

Inteligência: O autor defende que “o sistema de informação e inteligência representa o órgão sensível do dispositivo insurrecional”. É este sistema que os líderes da insurreição “obtém todos os dados necessários para ter uma noção o mais exata possível do funcionamento do próprio dispositivo, do meio geográfico e psicossocial no qual ele deve agir, e das características do inimigo”. A liderança e também as frentes devem conhecer o terreno em que vai se ter o confronto, a situação social da população, se esta é simpatizante ou não do movimento, e, sobretudo, conhecer intimamente o inimigo em sua vulnerabilidade e potência. Comando: a insurreição deve ter um comando político que deve dar unidade e direção política ao movimento; um comando militar para direcionar as forças sublevadas; e por fim, um comando supremo cujo caráter é político-militar que subordina os comandos anteriores e “que dá unidade política e direção militar a todo o movimento no seu caminho revolucionário”.

O POVO EM ARMAS – GUERRA POPULAR

O autor aborda a análise de Carl Von Clausewitz na teoria de armar o povo para enfrentar o inimigo invasor. Clausewitz formula cinco condições para o sucesso de uma guerra com o povo armado. 1) A guerra deve ser drenada para o interior do país, porque assim o soldado-cidadão que conhece seu próprio território pode se locomover, esconder e descansar sem ficar vulnerável ou dependente do exército regular. 2) O tipo de guerra adequado ao povo armado é de desgaste, de manobra, não apresentando frente fixa para que o inimigo consiga cercá-lo e aniquilá-lo. Deve vencer o inimigo pelo cansaço e não buscar a vitória num único combate. Deve atacá-lo nas suas linhas de provisões e não no grosso ou na parte mais forte do exército inimigo. 3) A guerra deve abraçar extensão considerável do território com o intuito de impedir que o inimigo o combate em uma frente única. Deve se espalhar no terreno obrigando o exército inimigo a penetrar no território dividido em várias frentes, enfraquecendo suas forças e debilitando sua capacidade de fogo. 4) As medidas tomadas devem corresponder ao caráter nacional. A guerra deve ser para a defesa do povo, da identidade cultural e moral da nação. 5) As características geográficas do país devem servir de teatro das operações. Quanto mais acidentado e grande for o território, maiores as chances de defendê-lo. Clausewitz defende que “o armamento do povo não é uma estratégia, mas sempre funciona como tropa auxiliar do exército regular”. Sua função é desgastar o inimigo.

GUERRILHA E REVOLUÇÃO

A guerrilha pode ser utilizada por uma política tanto revolucionária quanto reacionária. É sempre a definição política que caracterizará a guerrilha e não o contrário. Não é a tática que define o tipo de guerra, mas a política que a comanda. Florestan Fernandes defende que o Estado se desenvolve a partir de uma de suas estruturas burocráticas: as Forças Armadas. Ou seja, defende que o Estado se desenvolve a partir da guerrilha. Fernandes defende que o guerrilheiro ainda não é político. Pierre discorda. Ele defende o nascimento do homem político como guerrilheiro e discorda da idéia de que do guerrilheiro nasceu o político. Fernandes “transformou a guerrilha, que é uma tática de guerra e que, como tal, pode ser instrumento da ação revolucionária, em princípio estratégico e fundamento político da revolução”.

O autor cita Carl Schmitt que define quatro características que definem a singularidade do guerrilheiro: a irregularidade, a mobilidade, o intenso compromisso político e o caráter telúrico. “A guerra revolucionário não combate apenas o exército e o domínio político da classe no poder, mas também a ordem jurídica que fundamenta e dá-lhe suporte”. A irregularidade da guerrilha se dá do ponto de vista tático. É uma forma armada não regular, ou seja, “não possui nenhuma das características identificadoras do exército regular, como uniforme reconhecido, bandeiras identificatórias, hierarquia rígida, reconhecimento internacional” – logo, se difere das tropas regulares. A sua irregularidade só é definida por meio da regularidade de outrem, no caso, o exército regular se antagoniza com o exército irregular. A ilegalidade é própria da tática de guerrilha. Os meios que se utiliza nessa forma de luta é que caracteriza o guerrilheiro num “fora-da-lei”. Além disso, o guerrilheiro busca quebrar a ordem institucional vigente que o declara como um “contra a lei”.

O intenso compromisso político dos que compõem a guerrilha tem um único objetivo: a conquista do poder político. É esse objetivo que não caracteriza o guerrilheiro como um criminoso e a guerrilha como atividade criminosa, pois ao contrário dos bandidos, não se utilizam da guerrilha para obter lucro fácil. A mobilidade tática é essencial na tática de guerrilha porque assim o guerrilheiro pode surpreender o inimigo com ataques rápidos e novamente sumir sem deixar rastros. O guerrilheiro, ao contrário do exército regular se caracteriza pelo mínimo de apetrechos bélicos possíveis, justamente para facilitar sua mobilidade. Ele “não precisa de grandes estradas para se locomover, nem de grandes acampamentos para descansar, nem de grandes linhas de abastecimento para comer”. O caráter telúrico se refere ao objetivo da guerrilha em defender sua terra do inimigo invasor: é o uso da idéia de defesa da pátria. Esse caráter telúrico da guerrilha se perde com Che Gravara que transforma a teoria da guerrilha ao defender que o mundo é o gigantesco teatro no qual ocorreriam as operações, já que a guerra não deveria ter caráter nacional, mas internacional, universal contra o inimigo imperialista. A revolução era uma causa universal em defesa da liberdade. A guerrilha tem por objetivo tático na guerra revolucionária “criar focos político-militares de resistência que, a partir da propagação e da criação de uma base fixa, consigam se desenvolver e crescer até formar um exército regular que possa buscar a decisão por meio do combate”.

(Lucimar Simon)

domingo, 13 de junho de 2010

Texto: A PROPÓSITO DE CUBA E DA REVOLUÇÃO

Texto - (Paulo Barsotti e Terezinha Ferrari) A PROPÓSITO DE CUBA E DA REVOLUÇÃO

As repostas surpreendentes que Cuba vem dando aos seus dilemas históricos têm provocado fascínio e expectativas desde o enfrentamento secular a vastos impérios: coloniais, neocoloniais e estalino-czarista até a tenaz resistência de seu povo à queda do leste europeu, sempre lutando pela sua autodeterminação nacional jamais desligada do espírito internacionalista. O que intriga e fascina é como o povo cubano ainda se mantém fiel aos compromissos e conquistas da revolução de 59, quando outros Estados mais avançados materialmente, sempre lutando pela sua autodeterminação socialista, desmantelaram-se como castelo de cartas.

Refletir sobre Cuba é imperativo, trata-se de buscar o entendimento desta forma social híbrida, que ainda resiste como o momento privilegiado à crítica ao estalinismo e à retomada do genuíno pensamento de Marx. Até finais do século XVIII, quando outras colônias do império luso e espanhol se desenvolviam com a extração de minérios ou da agricultura-exportadora, Cuba cumpre importante papel como entreposto comercial e militar elo de mediação entre as colônias americanas e a metrópole hispânica.

O internacionalismo de Martí sustentava-se não só na construção de uma nação politicamente independente como também na emancipação do predomínio econômico norte-americano. A revolução cubana de 59 realiza uma proeza: uma revolução democrática e popular fortemente marcada pela afirmação popular e antiimperialista. Mais uma vez, a burguesia nacional demonstrava sua fragilidade e incapacidade de avançar sem a conciliação com o capital externo. Tal revolução só possuía fôlego para ir até a queda de batista: a revolução nacional-popular e antiimperialista aspirava ao comunismo.

Mesmo com a particularidade histórica que sustenta a condição de trilhar caminhos próprios, Cuba, não pode fugir ás determinações da Guerra Fria. Nesta circunstancias históricas extremamente contraditórias, em 16 de abril de 1961, a opção socialista de Cuba é declarada por Fidel Castro. Esta inserção ao bloco estalinista reproduzirá uma dupla tragédia: primeiro, herda todos os limites estruturais já consolidados pelo sistema que opta, segundo, porque não conseguirá livrar-se da subordinação econômica externa, transitando da condição do país pobre capitalista dependente à de socialista dependente. Contudo manteve-se herdeira de suas lutas anteriores, desde os tempos de Martí, do espírito democrático-popular e da autodeterminação nacional. O que parece ser uma das chaves para a compreensão de sua resistência atual. Marx e Engels considerava absurda a idéia de um socialismo, como queriam os populista, em sociedades baseadas em uma economia agro-pastoril. Nestas sociedades atrasadas, logo após a revolução, a carência se restabeleceria e com ela a “luta pelo necessário” e a disputa pela apropriação do excedente reduzido produziria apenas a “socialização da miséria”.

A situação que Cuba herda a partir da “opção” pelo bloco estalinista demonstrou que não basta a transformação da propriedade privada, do trabalho assalariado e do estado capitalista para aniquilar o capital. A coerção “invisível” do mercado sobre o trabalho é muito mais eficiente e vantajosa para o capital que as coerções política, física ou político-partidária autonomizada. Mèszáros identifica a diferença fundamental entre o sistema capitalista e o pós-capitalista soviético “na forma de extração do trabalho excedente: essencialmente econômica no capitalismo, e obviamente política na URSS” onde a personificação do capital emerge na figura da burocracia soviética que exerce o papel de gestor do capital, através do domínio político visível e direto da força de trabalho.

As revoluções que se pretenderam socialistas neste século não foram muito além da destruição capitalista. Diferentemente, Cuba pelo menos até o momento, mantém-se resistindo ainda que contraditoriamente, à queda da URSS e ao bloqueio imposto e reimposto pelos EUA numa demonstração da garra histórica forjada nas lutas do povo em busca da emancipação nunca exclusiva a seu espaço geográfico. Em 1959, Cuba contou com a ajuda soviética, hoje só conta com o seu povo e o triunfo da História. A tese é que vale a pena defender Cuba na radicalidade crítica de sua Historia.

GUEVARISMO E OS CAMINHOS DA REVOLUÇÃO

Guevara adaptou para o continente, de acordo com as contingências da época e da região, um largo leque de direcionamentos, tanto de conduta pessoal como de política econômica, tendo seus textos abrangência de temas que iam desde métodos para melhor eficácia em ações guerrilheiras, quanto análises sobre relações entre países, a criação do homem novo, e a luta contra o imperialismo. Não apenas humanista e idealista, mas também essencialmente prático Guevara exemplificou o marxismo como análise sócio-histórica e como guia para a ação, mesmo acusado por alguns de aventureiro e revisionista.

Numa realidade onde os PCs do hemisfério comportavam-se de forma tímida, esperando a revolução ao invés de fazê-la, temos na guerrilha um substituto dos partidos tradicionais. Além disso, ao contrário do que diziam alguns críticos, Guevara não desmereciam o papel do partido na revolução. Para ele era necessário se fazer uma frente única contra o maior inimigo o imperialismo e seus colaboradores internos, o internacionalismo proletário é essencial para compreender o pensamento de Guevara. Em relação ao indivíduo, Guevara acreditava que o revolucionário deve está pronto a lutar em qualquer lugar que necessite de seus esforços. Para a libertação de um povo, que, ao combater ao seu lado, também se tornaria seu.

Como Trotski, Guevara era a “consciência” da revolução. Eram a favor de um bloco internacional contra o capitalismo. Sendo assim, a coexistência pacifica para eles, portanto, era ilusória e absurda. Dizia ele que o Lênin dos anos 20 é tão somente uma pequena parte de Lênin, porque Lênin viveu vários anos e estudou muito. O Tche tinha como objetivo a luta em grande escala n terceiro mundo, e pensava que com a guerra no Vietnã, seria necessário abrir novas frentes de resistência ao contra o imperialismo.

A concepção do homem novo é também um dos elementos do ideário guevarista. Para ele, para chegar ao comunismo è necessário criar bases materiais ao mesmo tempo em que se cria o homem novo. “o trabalho voluntário se converte então em um veiculo de ligação e de compreensão entre os povos trabalhadores administrativos e os trabalhadores manuais para prepara o caminho em direção a uma nova etapa da sociedade, onde não existirão as classes e, portanto, não poderá existir diferença alguma entre trabalhador manual e trabalhador intelectual, entre operário e camponês”(Che).

Para Guevara, a moral revolucionária não se podia confundir com a rigidez estalinista, ou mesmo chinesa, tampouco com a extrema flexibilidade de alguns países da Europa Oriental. Como a Polônia em sua época. Guevara havia dito que “o individualismo, como tal, como ação única de uma pessoa colocada só em um meio social, deve desaparecer em Cuba”. De acordo com o sociólogo americano Maurice Zeitlin, “contra a acusação de que” o período de construção do socialismo se caracteriza pela abolição da individualidade em benefício do Estado “o Che replicou com ‘os efeitos da experiência cubana’, cuja base é o “homem individualizado, específico e com nome”.

Lênin já dissera que “nos não consideramos de modo algum a teoria de Marx como algo acabado e intocável; pelo contrário, estamos convencidos que ela apenas assentou a pedra angular da ciência que os socialistas devem fazer avançar em todas as direções se não querem atrasar-se em relação à vida”. Guevara elaborou um marxismo original, a partir de das premissas mestras da doutrina. Como Mariátegui, foi criticado. Em suas palavras, Guevara dizia: “não pretendo ser um economista, mas simplesmente, como todos os combatentes revolucionários estou nesta nova trincheira onde me colocaram e tenho que estão preocupados como poucos com o destino da revolução”. Guevara tornou-se um símbolo de luta, também foi incorporado no imaginário do continente e sua figura tornou-se quase santificada. Para Fidel Castro, a revolução propicia a consciência revolucionária. De acordo com ele é um equívoco acreditar que a consciência deveria vir em primeiro lugar. Guevara menciona que a guerra revolucionaria só deve ser iniciada em condições especificas, e como último recurso.

(Lucimar Simon)

domingo, 6 de junho de 2010

Texto: AS REVOLUÇÕES NO MÉXICO

Texto - Américo Nunes: AS REVOLUÇÕES NO MÉXICO

Francisco Madero escreveu um livro com o título a sucessão presidencial em 1910, com o subtítulo “o Partido Nacional Democrático”. Madero era um rico proprietário de terras pertencentes a uma das maiores famílias do norte do país. Ele acredita que o regime de Porfírio Diaz encontrou junto aos capitalistas seus mais fiéis apoios. O objetivo desse livro é a formação de um grande partido político que será o Partido Nacional Democrático. Madero pensava que fosse possível fazer um acordo com Diaz: este último conservaria a presidência, mas a vice-presidência seria ocupada por um membro desse partido.

No início de 1910 Madero era o único a candidato à presidência a disputar com Diaz. No dia 26 de Abril Madero e Vazquez Gomes apresentam a seguinte plataforma de governo: não reeleição, sufrágio direto, liberdade política, de imprensa e de ensino, melhoria de condições de vida dos operários; fundação de colônias agrícolas, tentativa de solução do problema do índio; luta contra os monopólios e privilégios; encorajamento à grande e sobretudo à pequena agricultura; mexicanização do pessoal das estradas de ferro; reforma do exército e ensino militar obrigatório; reforço das boas relações com os paises estrangeiros; investimentos em fundos públicos.

Evidentemente a campanha de Madero inquieta as autoridades. A 7 de junho ele é preso acusado de incitação à rebelião. Na noite de 5 ou 6 de outubro ele foge para San Antônio, no Texas onde redige Plan de San Luís. Este plano se transformou na plataforma da revolução de 1910. Madero reafirma o sufrágio universal, a não-reeleiçao presidencial. A insurreição é marcada para o dia 20 de novembro do mesmo ano.

Na visão de Nunes esse plano é muito pobre em matéria de renovação social e econômica: trata-se, sobretudo um plano político. O Programa pela candidatura era mais radical. Não propunha mais melhorara as condições de vida dos trabalhadores, proteger a raça indígena, não evoca também a necessidade de combater os monopólios e os privilégios, por exemplo.

A 13 de maio de 1910, as autoridades policiais fazem uma série de detenções contra os partidários de Madero e toma um deposito de armas e munições. A revolução parecia estar comprometida. No entanto, Madero recebe apoio de Pascual Orosco que liderou um grupo de mineiros e de Francisco Villa, um antigo ladrão de rebanhos. Além disso a família de Madero investe grandes somas de dinheiro na compra de armamento. A vitória pertence tanto aos madeiristas quanto aos federais. Após três dias de combate os revolucionários conquistam Ciudad Juárez e em seguida se estabelecem negociações de paz entre as forças revolucionárias e as do governo. Em 25 de maio, Diaz e o vice presidente se demitem. É formado um gabinete provisório por Francisco L.de la Barra, a fim de convocar eleições gerais. Nunes afirma que a queda de Diaz, não resultado de uma derrota militar importante. Trata-se de uma derrota moral. Mas o essencial é que ela é compartilhada pela opinião pública, verdadeira vencedora de Porfírio Diaz. No dia 6 de novembro Madero é eleito presidente da República em plena crise nacional.

O gabinete de Madero é constituído por liberais e conservadores. Mas de maneira geral é um governo liberal. A maior parte dos problemas sociais continuou sem solução. Percebe-se que muitas organizações de operárias foram constituídas graças às liberdades políticas asseguradas pelo novo regime. Muitas dessas organizações participaram de múltiplas greves que marcaram a crise social do governo Madero. Madero tentou reforçar o capital industrial nacional. No entanto o seu governo entra em profunda crise. Os interesses petrolíferos tentaram se aproveitar disso. Madero estava praticamente só, ainda não havia tomado medidas socioeconômicas destinados a transformar a estrutura do interior. O governo é incapaz de propor uma verdadeira reforma agrária.

Diante dessa situação Zapata se revolta reclamando as terras comunais e os terrenos usurpados dos habitantes de sua aldeia. A 25 de novembro de 1911, o Exército Zapatista promulga o plan d’Ayala, dando um conteúdo social e agrarista à revolução. Esse plano proclama que todos os bosques e águas açambarcados pelos hacendados, políticos e caciques fossem devolvidos às comunidades rurais e defendidos de arma em punho; reclama a expropriação Diaz e um terço dos bens dos grandes proprietários fundiários. Nesse documento os zapatistas acusam Madero de haver traído a revolução, de impor uma ditadura ainda mais feroz que a de Diaz. Os habitantes de Morelos constatam que a revolução, ao invés de ajudá-los a conservar suas terras, os expulsa delas. Daí a ruptura entre o madeirismo e o movimento zapatista.

Pascual Orozco também se rebelou e ao contrario do levante zapatista de Zapata, é apenas uma fase de luta pelo poder político dentro do movimento madeirista. Considerado o mais popular dos generais madeiristas, Orozco toma o Estado de Chihuahua com o apoio de numerosos madeiristas. Os generais orozquistas também elaboraram seu plano. O Plan d’Orozco. Esse plano aborda a questão do trabalho e social. Mas não tem nada de um programa “anticapitalista” reformista.

Madero propõe a divisão dos terrenos comunais, dos nacionais e a compra de alguns grandes domínios que, divididos, constituiriam pequenas propriedades. Para tanto o poder cria a Comissão Agrária Executiva que deveria empreender a “reforma agrária”; fracionar e colonizar a grande propriedade. No entanto, essa tentativa não deu certa porque Madero se recusou a aceitar as proposições da Comissão. No final de 1912 Madero se debate a uma crescente crise. Os interesses petrolíferos ingleses e o exército federal são diretamente interessados na queda de Madero. Em 16 de outubro de 1912 o general Félix Diaz desencadeia um levante armado em Veracruz. Felix Diaz é preso, condenado à morte, mas é salvo pela generosidade de Madero e será 5 meses mais tarde o principal nome da contra-revolução. A deposição de Madero por Victoriano Huerta foi um momento violento da luta pelo poder entre os grandes proprietários fundiários, os banqueiros e os setores comerciais e financeiros ligados ao capital estrangeiro. Huerta toma o poder em favor dos grandes proprietários fundiários, banqueiros e financistas ligados ao comércio com a Europa. Ele instaura um regime de terror: troca os governadores dos Estados por militares, prende 80 deputados, forçam os antigos ministros a se demitirem, os intelectuais progressistas são obrigados a fugir.

Após o assassinato de Madero e de Pino Suárez, o governo de Huerta é reconhecido por quase todos os governadores dos Estados, menos Venustiano Carranza, que tentou reagrupar as forças contrárias a Huerta e propor um enfrentamento. O plano dele foi chamado de Plan de Guadalupe. Carranza acreditava que em primeiro lugar era preciso apelar para a união patriótica contra a Ditadura Militar. O Plano é essencialmente político. Repudia o governo de Huerta, bem como os novos poderes legislativo e judiciário. Carranza se qualifica como o primeiro chefe e tenta descredibilizar o governo de Huerta.

Diante do avanço militar dos constitucionalistas, Huerta dissolve as câmaras federais e decreta o recrutamento forçado. A pequena burguesia financista começa a manifestar certo descontentamento com o governo de Huerta. Ele é inclusive hostilizado pelo presidente dos EUA Woodrow Wilson por causa da questão do controle da exploração e Diaz produção petrolífera mexicana. Wilson então organiza represarias e apoio político aos constitucionalistas, inclusive com a imposição de um bloqueio econômico ao México. O Cônsul dos EUA assegura aos constitucionalistas que quer apenas a volta da ordem e da Constituição. Com efeito, a ocupação norte americano se limita a Vera Cruz, o que atrapalhou os planos de Huerta que queria apelar para o patriotismo para desvirtuar a luta dos constitucionalistas.

O conflito parece inevitável, no entanto, firma-se um protocolo de acordo. Em 23 de junho de 1914 Zacatecas é tomada pela Divisão do Norte, dirigida por Villa. Huerta se demite em 15 de julho. Essa vitória do exército constitucionalista representou a vitória da burguesia nascente.

Acontece, em seguida a ruptura entre Villa e Carranza por motivos culturais e sociais. Para o exército popular do sul carranza é um burguês que não pode reconhecer plan d’ayala,um ambicioso disposto a atrapalhar o trabalho do povo para os Zapatistas. Em setembro villa faz aparecer um manifesto contra Carranza, acusando-o de haver rompido o pacto de Torreon. Este manifesto de ruptura se relaciona à intenção de Carranza de elevar Divisão de Norte à categoria de Corpo do Exército, o que significaria a colocar Villa sob as ordens de Obregón. Villa se retira com suas tropas para Chihuahua. Carranza nesse ínterim o convida a participar da Convenção dos generais constitucionalistas a fim de discutir o programa da revolução. Villa se recusa a ir ao México. A convenção foi realizada em Aguascalientes, limite entre os territórios controlados por vilistas e carranzitas.

Em 19 de outubro a Convenção designa uma delegação para convidar Villa para participar dos trabalhos e uma outra foi convidar Zapata. Depois de longos debates os pontos do plan d’Ayala referentes à reforma agrária foram adotadas pela Convenção. A Convenção resolveu afastar Villa e Carranza de suas funções e prosseguiu seus trabalhos com a intenção de eleger um presidente provisório da República. Carranza não aceita todas as decisões da Convenção ele objetivava afastar Villa e Zapata para controlar as decisões da Convenção. A 4 de dezembro de 1914 Villa e Zapata fazem em Xochimilco um tratado de mesmo nome pelo qual se transformam em verdadeiros senhores da convenção. Deixando um pouco de lado todas e picuinhas conflitos que marcaram a crise pelo qual passava o México, a Convenção não conseguiu atender as necessidades por não ter conseguido arrebanhar para sua causa os trabalhadores recrutados pela Casa Del Obrero Mundial.

Constituição foi promulgada em 5 de fevereiro de 1917. Carranza foi transformado em presidente da República e deve promover uma luta encarniçada para impor os interesses nacionais sobre as reservas naturais do subsolo. Com a eleição de Obregón para a presidência (1920-1924), abre-se o chamado período da construção. De fato a reforma agrária constitucionalista em profundidade começa com Obregón. A reforma por sinal se choca com inúmeras dificuldades. Ela foi feita em pequena escala. Era colocado à disposição apenas uma pequena parte do latifúndio, além disso, só receberia terras aqueles que não tivessem mais de um herdeiro.

(Lucimar Simon)